quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

pai natal esotérico


Feliz Natal a todos. Faço sempre isto, aposto que o atraso das palavras chateia o palhaço de barbas brancas. Já gostei dele, já sim, mas foi à muito tempo. Não vou esquecer a tarde amarga em que o apanhei no berço com a minha joaninha, sacana. Sempre dormia a sesta das três ás cinco, mas quis o destino acordar-me por volta das quatro, nesse dezembro sem igual. Lá estava ele, nos braços da pura, inocente, apesar de minha, joana. Antes tudo bem, não era uma relação muito chegada mas pintávamos uns desenhos juntos, lanchávamos na mesma mesa, olá boa tarde, até amanha pá, indiferente. Depois disso nunca mais. Vi-o anos mais tarde, na tasca por baixo do meu apartamento, provocador, com fato vermelho, barba ainda por fazer, óculos redondos, barriga avantajada. Tentei ignorá-lo mas não esquecia as imagens adulteras... Ao primeiro soco respondeu-me com um pontapé na canela direita... Arranquei-lhe barba (ah, desculpa, pensava não ser verdadeira) e gritou que nem uma menina. Foi bonito sim, soube bem, mas rápido puxei da minha dignidade, mal entendi o cheiro da sua avançada embriaguez. Pediu desculpa três vezes e fiz jus à clemência. Ficamos a falar um bocado, chegou mesmo a chorar-me no ombro. Queixava-se que coca cola lhe ameaçou tirar o patrocínio, caso não conseguisse largar o álcool. Tive pena, mas entendi as razões, onze meses por ano a ser ignorado era um bom chamariz para a pinga. A curiosidade levou a não largar a conversa dessa noite, até ver despedaçada a intriga do porquê de ter chegado a um tão insólito posto na vida: foi na festa de anos de uma amiga, em dezembro, a jogar verdade ou consequência, perto da meia noite, escolheu consequência e teve que ir de pijama vermelho, pelas ruas da baixa, despejar o saco do lixo e gritar o que lhe viesse à pouca cabeça que tinha. Ás palavras tantas, apareceu um idiota sem espaço no telemóvel para mais que um vídeo de 3 segundos, que o filmou a dizer qualquer coisa parecida com “n'tal”. Rapidamente os jornais e telejornais se encheram com a polémica “Filho de primeiro ministro preso enquanto fazia desacatos na rua, únicas imagens gravadas são vídeo de 3 segundos bla bla bla a gritar natal.” O pai, após ter falhado a tentativa de fechar o youtube e acabar com a imprensa livre, decidiu reunir o conselho de ministros e impor que se criasse qualquer coisa festejável, de nome natal e com qualquer personagem vermelha. Isso ou outra coisa que elevasse o filho de ridículo a moderno, de moderno a mainstream. Um ministro democrata-cristão logo “tudo bem, podíamos era aproveitar para dinamizar uma tradição cristã”. O director da confederação da indústria portuguesa a ordenar “tudo bem, mas tem que haver prendas”. Um ex-ministro do estado novo, e ordenou “tudo bem, visto que a nação já não tem pai, pelo menos que o tenha essa coisa”. Ai o primeiro ministro “tudo bem, mas tem que ser o meu filho, que o rapaz não se anda a safar nos estudos e já tenho a matilha de assessores mais que completa” Aí veio um militante de esquerda “tudo bem, mas não pode ter trabalhadores precários” o mesmo que ouviu: “Eeeeelaaa, para lá com os radicalismos, o tipo vai ter duendes não sindicalizados a trabalhar todo o ano, e se algum espertalhão da direcção-geral do emprego e das relações de trabalho perguntar onde é sediada a empresa, dizemos que é na Lapónia”.
Dei-lhe boleia até ao metro e só lhe pus os olhos à coisa de dias, quando estava a passear as renas no parque eduardo vii.

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