No parque dos reis – era assim que se chamava, apesar de nunca ninguém
ter viso por lá um monarca para amostra – o Zé Pedro alimentava os
pombos com os resquícios do seu almoço, dando a este cenário laivos de
cliché ou, no mínimo, vulgaridade cénica. Aos poucos o céu começava a
chover, ao passo que ninguém no passado conjugou de forma tão banal um
verbo impessoal numa pessoa gramatical. Os pombos amontoavam-se na
calçada portuguesa, num rodopio que procura retirar monotonia a este
pequeno texto, doando-lhe a imagem dinâmica de uma bando de aves a lutar
por dúzias de migalhas. O Zé Pedro insistia em esfarelar o resto do pão
centeio, ao mesmo tempo que sujava a sua camisola velha, rota, única,
tingida ao ponto de toda a gente que esteja a ler isto ficar com a
certeza do Zé Pedro ser pobre, mendigo até. E depois tudo o que se
subentende, que este é um manifesto político, uma sátira social, que não
é acaso que o parque se chame dos reis – apesar de nunca nenhum monarca
lá ter ido - e menos acaso é nesse parque estar um mendigo a partilhar o
seu parco almoço, com animais ingratos que voarão mal tenham a barriga
cheia.
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