Existem
essencialmente três formas de entretenimento numa ponte aérea: reparar nas
pessoas, ler a revista de cortesia da companhia ou assistir televisão. A
primeira, pelo prazer que proporciona, merece uma análise separada. A segunda
costuma ser simpática porque vem cheia de fotografias bonitas, mas não dura
mais de 2 horas por mês. A última tende em ser menos interessante do que tentar
dormir, mas hoje não foi.
O documentário falava
sobre o problema da fome e do desperdício de alimentos no mundo. Embora este
seja um tema que me parece relativamente conhecido (pelo menos no bom senso dos
comuns) fiquei um pouco pensativo sobre a dimensão do assunto que era retratado
de forma bastante emocional. Os números são grandes. Eu lembro-me que são
grandes, mas não me lembro dos números. Só de um: 7.6% da população brasileira passa
fome ou tem problemas de subnutrição. A conta do martelo dá uns 15 milhões de
pessoas. Eu disse que os números são grandes.
O documentário
falava também de acções sociais que têm vindo a ser desenvolvidas em resposta a
este problema. As comuns os comuns já sabem. Interessei-me pela forma como
empresários de distribuição e retalho alimentar realizam doações de alimentos
‘sem valor comercial’ mas com ‘valor nutritivo’. Aquela banana pretinha ou a
cenoura partida ao meio que não vão fazer mal. Parece lógico. E mais do que
isso, parecia fazer diferença para as pessoas atrás da câmara. Metade da
cenoura, apenas, parecia fazer diferença. Havia também uma escolinha sediada
numa favela no Rio de Janeiro que ensinava as donas de casa da comunidade a
cozinhar com as cascas (e outros ‘desperdícios’) de suas frutas e verduras.
Primeiro ri-me, depois tocou o sino.
O negócio
criou-se imediatamente. Chama-se ‘Skin’, e somos uma cadeira multinacional de restaurantes éticos
gourmet. Nascemos em 2013 da iniciativa de nossos fundadores e associados em
combater a fome e a subnutrição no mundo. De nosso trabalho voluntário junto às
comunidades mais desfavorecidas em toda a América do Sul, aprendemos o segredo
de cozinhar a partir de ingredientes tipicamente considerados como
‘desperdício’, que são o foco de nossa arte. E como sabem, as cascas de frutas e
vegetais concentram a maior parte das vitaminas e nutrientes dos ditos,
apelando assim a uma população cada vez mais preocupada com a qualidade da sua
alimentação.
A aceitação do
público tem sido espantosa. Começando com apenas 3 pequenas unidades na zona
oeste da cidade, hoje estamos presentes em 14 países com mais de 150
restaurantes. O nosso modelo de negócio é baseado numa oferta tripartida que se
complementa. Temos o ‘Skin du Mer’.
Uma evolução do sushi tradicional: o nosso arroz é preparado com casca,
importado do sudeste asiático e especialmente tratado para ficar com um toque
crocante excepcional. Da Amazónia chegam peixes exóticos que preparamos da forma
incomum, servindo-nos essencialmente da cabeça do animal. Temaki de bochecha de Piranha,
com o nosso registado Arroz de Laos
temperado com raspas de limão e coberto com sementes de Pimentão amarelo é o
preferido de nossos clientes.
A nossa proposta
no ‘Skin du Terre’ é diferente. Trabalhamos
com uma variedade de cafés orgânicos, cervejas artesanais e sides doces e
salgados. Nossas potato skins são um fenómeno
nos fins de tarde ensolarados de Lisboa, acompanhadas por nossa cerveja Checa não
filtrada. O nosso brigadeiro de raspas de cenoura e casca de banana faz as
delícias dos mais gulosos.
Por último, o ‘Skin
Express’. A nossa marca para grandes superfícies comerciais que gradualmente tem ganho espaço na rotina das pessoas. Nossa tecnologia para a rápida confecção de
quiches revolucionou o dicionário de fast-food. O cliente pode escolher de
forma personalizada e única o recheio de sua quiche (cascas de maça, pêra ou outras frutas,
raízes de salsa ou coentros, sementes de vegetais, aquelas folhas do caule da
laranja que vêm agarradas, preparadas na chapa com torresmo de leitão, etc.), que será preparada em nosso forno vitesse em apenas 54 segundos. Uma opção rápida, diferente, saudável e saborosa.
É indiscutível
que o planeta se rendeu à nossa Skin
Cousine, fortemente pautada na visão humanitária de nossos fundadores. Hoje, o mundo inteiro só quer saber da casca da melancia. Dos
olhos do robalo. Daqueles fiozinhos castanhos do coco seco. Das flores da
batata. Tudo o resto ficou triste e obsoleto. Não existe nenhuma opção mais chic e ética do que a nossa.
Estamos com um
enorme problema em descobrir o que fazer com a polpa de tantas frutas e
vegetais. E claro, com o resto da Piranha.
Sashimi da bochecha dela não, mas já comi sopa de piranha. Era tipo uma canja de peixe, uma sopa aguada. Não era lá muito boa. Preferi o pirarucu no forno com arroz de banana, isso sim.
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