quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

"as escolhas dos povos são em democracia soberanas - até que se descubra melhor método"

Este foi o comentário de Helena Garrido à reacção de Peer Steinbrück (candidato do SPD e rival de Angela Merkel nas eleições gerais alemãs de Setembro) sobre os resultados eleitorais obtidos por Silvio Berlusconi e Beppe Grillo (um movimento não político ou mesmo anti-político) em Itália.

Aqui é necessário dizer novamente que Portugal não é a Itália, dando continuidade ao post do Fernando. A última vez que tivemos um "palhaço" a concorrer a umas eleições portuguesas foi José Manuel Coelho que levou apenas 4,52% dos votos dos Portugueses... o que é completamente diferente da situação italiana, onde o "palhaço" conquistou 25% dos eleitores em Itália, não dando o seu voto de confiança a nenhum governo.

"Ser honesto estará na moda", disse Grillo no seu primeiro comentário no Twitter, depois de conhecidos os resultados eleitorais. Apesar de ser um resultado democrático, não deixa de ser um resultado perigoso.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

E a moral é: 'Take care of the sense and the sounds will take care of themselves'


‘Mãe, mãe não encontrei o Amor!’ — ‘E procuraste debaixo do sofá, filho?’ O Amor não se encontra debaixo do sofá. (Há quem o encontre em cima do sofá: Amor, Paz, Paz e Amor e ganzas.) Não se preocupem, não vos vou falar de Amor, não acabei de vos dizer que o não encontrei?!
Quando era pequenino pensava que as nuvens estariam muito próximas, que me bastava subir aquele prédio de quatro andares para tocar. (Também achava que era profundamente estúpido os outros meninos pintarem em tons de azul as nuvens: ‘azul é o céu!’…na mesma linha, as uvas eram verdes e as maçãs amarelas, mas isso tinha a ver com a minha avó comprar apenas uvas brancas e maçãs golden. Eu não conhecia outras, uvas maçãs ou avós.)
A Lua. Quando somos pequenos queremos saber o que são as coisas e o porquê das coisas. Muitas vezes porém, contentávamo-nos com os nomes das coisas. ‘Mãe, o que é aquilo ali no céu?’ — ‘É a Lua, meu filho.’ Mas aquilo não é ‘a Lua.’ Falhou o artigo. ‘Lua’ é o nome de uma lua, a nossa. Se a mãe lhe dissesse, ‘Ah, aquilo é uma lua’, ela estaria correcta. A Lua é uma lua, a nossa.
Para o (grande) Daniel Tosh, essa seria the ultimate prank, educar um filho com as palavras trocadas. Chamar os morangos de ‘bananas’, as cadeiras de ‘beterrabas’ e a TV de ‘camarão’ (Algo me diz que estou com fome…) Apesar de engraçado, não o devo fazer. Ao invés, a alternativa menos arriscada: versões politicamente incorrectas dos contos infantis: a capuchinho má, o lobo mau bom. That would mess’d them up quite enough.
Preferi não o fazer.
A academia produz muita treta. Em estudos organizacionais como em outros, reina o senso-comum. Aparentemente, tudo o que se diz, a gente já sabe — ou já leu algures. Isto é em boa parte verdade e nem os investigadores pretendem outra coisa quando resolvem testar certas platitudes acerca do desempenho, das emoções, etc. Testam cientificamente lugares-comuns que são como que hanging hypotheses. Porém, não é difícil encontrar no senso-comum teses contrárias. Por isso, em boa parte, não importa que lugares-comuns os investigadores testem pois tudo é um lugar-comum algures. 
O que nestes estudos importa é, em boa parte, fixar termos, estabelecer uma linguagem comum. Conhecemos várias vantagens de tal estabelecimento. Permite, entre outras coisas, definir um common ground a partir do qual se geram discussões, regradas e, consequentemente, resultados. A linguagem deve ser neutra, claro está (e, ‘pois…’). Mas existe outra vantagem que quero destacar: evita que cada um escreva para si, o individualismo científico, traduções e acusações (‘Ah, mas fulano y tal já escreveu isto’ — por outra palavras, é verdade — ‘por isso, fulano x não é original!’ Que parvoíce! O orgulho de infirmar a originalidade de um investigador/autor.)
A partir do momento que os termos estão fixos e a linguagem bem formada, não existe mais espaço para dizer o mesmo por outras palavras. Como tal, a invenção será tendencialmente real e nunca literária. Seja x um tópico, xn uma tese sobre x e k, l e m modos de falar sobre x. Fixado que está k, quem quer que diga x1 terá que dizê-lo por meio de k (<xnk>). Dificilmente alguém se faz passar por inovador, avançando com x1 com linguagem m, quando <x1m> = <x1k>. Não se diz o mesmo por outras palavras; a repetição é imediatamente notada — passa a ser ‘divulgação.’ A invenção e a acumulação de conhecimentos são pois genuínas.
Arganaz dixit

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

elogio à herança

Aquartelar. Agora que penso em aquartelar. Há palavras que parecem brincadeira. Aquartelar. Na escola primária, lembro-me, a professora disse que as palavras começadas em Al eram de origem árabe. Sem percebermos a distinção entre geralmente e sempre, os daquela aula, os que presenciámos essa tirada de catalogação lexical começámos a descobrir todas as palavras árabes que existem na nossa língua, alface, Algarve, Al Capone, algures, algum, alecrim, Alentejo, alfarroba, alheira, alarve, por aí fora, ao mesmo tempo que nos desfazíamos em exclamações várias, 'bolas, os árabes tinham montanhas de palavras, às tantas ainda somos árabes sem saber'. Agora penso em aquartelar e descubro aquilo que é uma palavra vinda tipicamente da engenharia. Engenharia linguística. Pegar num substantivo comum, enfiar-lhe afixos e sufixos até dar à luz um verbo. Quartel não chegava, tinha que se inventar uma palavra para dar nome a acto ou efeito de meter dentro do quartel. Como engavetar, como alojar, como albergar, como ensacar. Então às tantas somos todos engenheiros sem saber. Agora que penso, o currículo de qualquer pessoa é necessariamente incompleto. Por exemplo, sem saber, todas as pessoas são árabes e engenheiras. Ou, tudo aquilo que somos é aquilo que outros construíram no passado.