sexta-feira, 20 de julho de 2012

Bernardo procura emprego

Bernardo tinha na sua carteira uma conselheira fiel. Quando ficou suficientemente vazia por um período de tempo suficiente, Bernardo ouviu dela o parecer: vai arranjar emprego. E foi. Na primeira entrevista vestiu o fato que adaptara do antigo traje académico. Chegou pontualmente à sede da empresa, rejeitou altivo o café que lhe ofereceram e entrou no gabinete que lhe indicaram. Passada meia hora de conversa com a responsável dos recursos humanos, foi alvejado com um “você não tem espírito empreendedor”. 
O Bernardo aprendeu a ser persistente com as folhas do pinheiro bravo que avistava da minúscula janela do seu quarto alugado. Não desistiu. Dias depois, vestiu o mesmo fato e desta feita superou-se. Aguentou quarenta minutos antes de levar com um “desculpe, falta-lhe espírito de sacrifício”. 
Claro que o Bernardo não desistiu por aqui, não vacilou nem perdeu convicção. Era um rapaz duro. Aprendeu-o com o mesmo pinheiro, o qual se mantinha inerte fosse qual fosse a voracidade do vento. Na terça-feira seguinte, voltou a uma entrevista. Aí levou uma lição que faria cair a auto-estima de qualquer um. Disseram-lhe, apenas vinte minutos volvidos, “não tens espírito crítico”. 
Vestiu o mesmo fato e foi à quarta entrevista. Despacharam-no a dizer que não revelava espírito de grupo e entreajuda. Sentiu-se diminuído na sua própria lucidez, por não entender como lhe haviam avaliado o espírito de grupo, se a entrevista era individual. 
Foi a machadada final. Não em si próprio, note-se, machadada final no pinheiro bravo que avistava da minúscula janela do seu quarto alugado. As próximas lições da velha árvore seriam de música, usando o som do seu próprio crepitar numa lareira de Inverno. Bernardo, esse contornou o seu fado. Cobriu-se de latas e pendurou-se num canto do seu quarto. Por ali ficaria a servir de espanta-espíritos.

domingo, 15 de julho de 2012

Retirado do Eixo do Mal

44 países num minuto.

Brutal.

Da série: "Os ricos que paguem a crise!"

Homem mais rico de Portugal com dificuldades de financiamento

"Alguns bancos estrangeiros recusaram financiar a compra de acções da Galp que os italianos da ENI acordaram vender à Amorim Energia, mas Américo Amorim diz que vai comprar estas ações antes do prazo terminar"

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Da série: "Portugal não é o Burundi" (III)

Portugal não tinha excedente comercial desde a II Guerra

"Há 70 anos que Portugal não vendia mais ao exterior do que comprava e segundo o Banco de Portugal esta inversão de perfil irá acontecer já este ano: a previsão é ligeira para 2012 (0,4%), mas sobe em 2013 para 2,5%, o que irá permitir que o saldo externo global também chegue a valores positivos, um dado que merece nota sobretudo porque Portugal não regista o sinal «mais» neste capítulo há décadas."

quarta-feira, 11 de julho de 2012

terça-feira, 10 de julho de 2012

Equivalência

Porque é que os funcionários públicos não podem ser despedidos?

Vídeo de Pedro Santos Guerreiro, director do Jornal de Negócios aqui.

Cenas sobre uma cena que nem os cientistas têm a certeza do que realmente é

Sobre o programa de hoje do Prós e Contras, o meu irmão mostrou-me um vídeo de um professor que ele teve no Técnico. O senhor chama-se João Seixas e para além de dar aulas no IST é também um dos cientistas e investigadores do CERN, o Laboratório Europeu de Física de Partículas.

João Seixas fala-nos no vídeo sobre o Bosão de Higgs, sobre o Modelo Padrão, sobre o LHC e sobre mais uma catrefa de nomes estranhos que eu não percebo porra nenhuma. Mas o engraçado do vídeo é o exemplo que ele dá para tentar explicar o facto dos cientistas do CERN terem anunciado ao fim de 50 anos de investigação, a descoberta uma partícula nova que pode ser (ou não porque ainda não há 100% de certezas) o Bosão de Higgs:

“Se eu tivesse coisas do tamanho de um grão de areia, então, o que ia acontecer é que o número de colisões dava para encher uma piscina olímpica e dessa piscina olímpica aquelas que nós tínhamos que encontrar eram os grãos de areia que cobriam a ponta de um dedo. Portanto, isto dá para dar uma indicação da dificuldade que existe em encontrar esta partícula. Mas ela é absolutamente crucial porque sem ela, de facto, o «Modelo Padrão» não estava completo.”

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Há uma linha que separa o que é constitucional e o que é inconstitucional

"Parece-me que em breve será decretado o despedimento de funcionários públicos. Em conformidade com o que o Pedro referiu aqui em baixo, esta decisão do Tribunal Constitucional indicia que os trabalhadores com esse estatuto não possam ter um tratamento de excepção em relação ao sector privado. Aguardo, pacientemente, que a equidade seja reposta também nos vínculos laborais."
[Nuno Gouveia, no Cachimbo de Magritte]

"Agora que o Tribunal de Contas decretou que o corte nos subsídios dos funcionários públicos é inconstitucional, por ferir o princípio da igualdade, é ocasião de nos perguntarmos se a ADSE e a Caixa Geral de Aposentações (CGA) não serão também inconstitucionais. A ADSE discrimina os cidadãos do sector privado nos cuidados de saúde e a CGA dá reformas aos funcionários públicos em condições muitíssimo mais favoráveis do que no sector privado? Não serão estes casos também flagrantes exemplos da violação do princípio da igualdade? Não serão inconstitucionais?"
[Pedro Braz Teixeira, no Cachimbo de Magritte]

Para começar, V. Exa. não enfrenta o fantasma da falência, ao contrário do mero mortal que trabalha lá fora, esse sítio onde se fazem contas à vidinha. (...) Eis, portanto, a primeira inconstitucionalidade, que é a causa da segunda: V. Exa. não enfrenta o espetro do desemprego. (...) Em terceiro lugar, parece que a Caixa Geral de Aposentações de V. Exa. garante reformas num regime privilegiado em relação ao resto da população . E o que dizer da ADSE, a quarta inconstitucionalidade? (...) Quinta inconstitucionalidade? A taxa de absentismo de V. Exa. é seis vezes superior à das empresas normais e essas empresas nunca tiveram a prática das promoções automáticas, outro mistério inconstitucional (o sexto). Sétima? Por que razão a percentagem do PIB português utilizada para pagar salários da função pública é superior à média europeia? Oitava? Bom, poderíamos estar aqui o dia todo, poderíamos chegar até à vigésima, mas por hoje já chega, meu caro amigo. (...)

[Henrique Raposo, Expresso]

Passos Coelho, põe os olhos na Itália!

A Itália é neste momento um case study por ter sido o 1º país europeu a ter um Primeiro Ministro "tecnocrata" a convite do seu presidente (ou seja, não eleito democraticamente pelos seu povo).

Eu acredito no Mário Monti desde o dia em que anunciou o plano de austeridade para a Itália estimado em 24 mil milhões de euros para combater a crise da dívida soberana. Nesse mesmo dia, disse que ia abdicar do seu salário de primeiro-ministro e de ministro das Finanças ao achar que "No momento em que exigimos sacrifícios a todos os cidadãos, parece-me ser meu dever renunciar ao meu salário". Pode parecer populismo, mas a partir desse dia eu acreditei no gajo.

No entanto, não é sobre o plano de austeridade italiano que eu venho aqui escrever, mas sobre o modo como o governo italiano está a fazer a austeridade. Na passada 6ª feira, li que a "Itália aprova cortes de despesa de 26 mil milhões de euros para evitar subida de IVA", ou seja, segundo este tecnocrata, antigo comissário europeu, filho da puta de progressista do caralho da revolução que vos foda a todos, "Uma subida do imposto teria graves consequências na economia", e por isso, este filho da puta de progressista do caralho da revolução que vos foda a todos "optou por medidas como redução do número de funcionários públicos e a diminuição para metade do número de autarquias".

Por cá, a história é outra. Primeiro, o "Tribunal Constitucional vetou o corte nos subsídios", ou seja, considerou que a suspensão dos subsídios de férias e Natal, por ser feita apenas para os funcionários públicos, pensionistas e reformados, viola o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição. Na sequência disso, "Vitor Gaspar prometeu estudar cautelosamente as alternativas ao corte de subsídios chumbado pelo TC" no sentido de cumprir com os limites do programa de ajustamento assinado com a Troika. Até aqui tudo normal... a não ser que essas «alternativas» sejam responsáveis por quase 2/3 da redução do défice como se pode ler aqui: "Passos disse que a carga fiscal já era "insuportável" e agora vai subir mais", ou seja, "Se o Governo avançar com um imposto extraordinário que garanta 2 mil milhões de euros, passa a ser a receita a assegurar quase dois terços da consolidação em 2013".

Resumindo, eu não quero saber quais é que são as opções possíveis que temos porque não sou economista. Eu apenas quero saber porque é que Mário Monti acha que o estado está gordo e a economia está frágil e então “As medidas têm como objectivo reduzir a excessiva despesa pública, enquanto se aumenta a produtividade do governo, sem prejudicar o nível de serviços”, e porque é que Passos Coelho acha que o estado está gordo e a economia está frágil e então "Passos disse que a carga fiscal já era "insuportável" e agora vai subir mais".

Para lembrar que aumentos de impostos são escolhas e não inevitabilidades...

Muito menos o próprio

"John Major, sucedendo a Margaret Thatcher, foi Primeiro-Ministro do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, chefe do governo de Sua Majestade. Não tinha licenciatura. Ninguém achou que precisava de uma para exercer o seu cargo, ninguém lha exigiu, ninguém o achou diminuído. Muito menos o próprio."
[Via 31 da Armada]

sinais dos tempos (II)

Eu não percebo porque é que o Fernando diz que "o mundo está cada vez mais desinteressante", se é possível fazer-se analogias na CNN com o Justin Bieber...

sábado, 7 de julho de 2012

muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o coronel aureliano buendia havia de recordar aquela tarde remota em que o seu pai o levou a conhecer o gelo

os dois únicos livros que li do Gabriel García Márquez são também dois dos meus livros favoritos. dois livros que as notícias acerca do autor me obrigam a recordar. Memórias das minhas putas tristes e Cem anos de solidão. do primeiro conta-se a história de um homem que aos 90 anos tem o discernimento que Gabriel García Márquez não terá quando chegar a essa idade, tornando-se cruelmente a criação mais forte do que o criador. o segundo li-o cativado pelo início bonito, célebre, no qual se brinca com a memória do coronel Aureliano Buendia. 
tempo, memória, lucidez são para mim coisas que gabriel garcia marquez conquistou, por exemplo, com os dois livros anteriores. são traços que se confundem com a sua identidade, traços que só perderá quando José Arcadio Buendía deixar de ser o fundador de Macondo, ou quando Amaranta perder a virgindade.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

sinais dos tempos

é um sinal dos tempos. hoje ouvimos homens (velhos) rabugentos (nostálgicos) gabaram-se que viram o homem ir à lua. imagino que um dia possa ser assim, gabar-me que vi a conferência onde anunciaram a descoberta do bosão de higgs. com as diferenças que tiram romantismo ao gesto. outrora o homem chegou a lua numa televisão minúscula, a preto e branco, num café cheio de pessoas que se juntaram à volta do único aparelho da aldeia. hoje o bosão de higgs chega num stream embebido em html, a uma pessoa solitária que lhe vai dando uma olhada no intervalo do estudo. antes havia um fato de astronauta, frases marcantes e bandeiras. hoje há gráficos, processos estatísticos, umas tretas de monte carlo. nem a porcaria de uma fotografia, do tal bosão. o mundo está cada vez mais desinteressante.

quarta-feira, 4 de julho de 2012