segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Parabéns Fidel



Fidel Castro, encarnação do demónio na terra, origem dos males da humanidade, papão de todo e qualquer tipo de resquício democrático faz, estranhamente e como qualquer mortal, anos: 84 anteontem. Na ressaca do aniversário, achei conveniente aprender qualquer coisa acerca de Cuba, o inferno que habita, e fazer do tema uma espécie de reentré na mentira.
Cuba. Diz-se que o Frodo podia ter escolhido destruir o mais famoso anel em Mordor ou Cuba, e escolheu a primeira opção por achar que optar pela segunda seria e cito “difícil”. De facto, apesar de tolkien ser britânico, ninguém, ocidental que se preze, duvidará que de tamanha harmonia, o shire só se poderá situar nos estados unidos, fazendo do Frodo um alegre estadouniense. Além de achar orcs mais dóceis que comunistas, também pesou na decisão do famoso Hobbit a chatice que seria ir contra a lei que impede um vulgar norte-americano de visitar Cuba.


(...)
2. Entre ilusões e dificuldades, Cuba conseguiu um decidido protagonismo, principalmente no contexto económico e político do Caribe e da América Latina. Por outro lado, alguns sinais de distensão nas suas relações com o vizinho Estados Unidos deixariam pressagiar novas oportunidades para uma aproximação mutuamente benéfica, no pleno respeito da soberania e do direito dos Estados e de seus cidadãos. Cuba, que continua a oferecer a numerosos países sua colaboração em áreas vitais como a alfabetização e a saúde, favorece assim a cooperação e solidariedade internacionais, sem que estas estejam subordinadas a mais interesses que a própria ajuda às populações necessitadas. É de esperar que tudo isso possa contribuir para tornar realidade o chamado que o meu venerado Antecessor, o Papa João Paulo II, lançou na sua histórica viagem à Ilha: "Que Cuba se abra com todas as suas magníficas possibilidades ao mundo e que o mundo se abra a Cuba" (Discurso na cerimónia de chegada a Havana, 21 de Janeiro de 1998).
3. Tal como outros muitos países, a sua Pátria sofre também as consequências da grave crise mundial que, somada aos devastadores efeitos dos desastres naturais e do embargo económico, golpeia de maneira especial às pessoas e famílias mais pobres. Nesta complexa situação geral, aprecia-se cada vez mais a urgente necessidade de uma economia que, edificada sobre sólidas bases éticas, ponha às pessoas e seus direitos, seu bem material e espiritual, no centro de seus interesses. Com efeito, o primeiro capital que se há de salvaguardar e salvar é o homem, a pessoa na sua integridade (cf. Caritas in veritate, 25).
(...)
-Excerto da Carta Credencial do Embaixador de Cuba junto à Santa Sé, escrita por Papa Bento XVI



Nunca vivi em Cuba, nunca procurei emprego em Cuba, nunca fui a Cuba e nunca falei com nenhum Cubano. Assim, aquilo que procuro formular, tem como base apenas textos, documentos de opinião, estatísticas, por aí fora. Tentei escapar a juízos de valor com base em simples notícias televisivas ou filmes de hollywood onde heróis norte-americanos explodem terroristas sul-americanos. Cá vai:
Cuba é, em vários dialectos, sinónimo de ditadura (ou carência de democracia no mínimo), e por aí começando, porque não explorar o sistema eleitoral cubano, pegando na sua Constituição? De ínicio ressalve-se a especificidade do partido comunista cubano e da sua relação com o processo eleitoral. O PCC assum-se como o partido único em Cuba e como promotor do processo revolucionário, tal como prevê a Constituição cubana de 1976, vigente e aprovada por referendo nacional. Este partido não pode interferir em momento algum com o processo de eleição do governo. Não pode nomear candidatos e não pode nenhum favorecer. Estes candidatos são escolhidos de entre a população e de entre os mais variados ramos profissionais, em assembleias populares, de acordo com a sua região. Do conjunto destes candidatos são votados pela população e escolhidos os Deputados, membros da Assembleia Nacional. Estes Deputados irão depois votar os membros do Conselho de Estado e o Presidente deste orgão. Aqui chegamos a Fidel (actualmente Raúl, vá). Fidel Castro nunca foi um auto-proclamado líder, ou de forma mais formal, auto-proclamado Presidente do Conselho de Estado. Fidel foi escolhido numa assembleia popular como candidato, votado para chegar a Deputado, votado pelos deputados para ser membro do Conselho de Estado e votado para ser seu Presidente. Bastante ditatorial... Repare-se que no contexto actual português, o partido do poder não teme impôr disciplina de voto aos seus deputados nem demonstra renitência em expulsar dezenas de militantes culpados do crime de uma candidatura autárquica à revelia do partido. Bastante pluralista...


Outro dos temas que hoje em dia mancha Cuba é a questão dos seus presos políticos. Urge introduzir o papel levado a cabo pelos EUA e pela CIA e a sua obcessão com uma contra-revolução. Convido os prezados leitores a fazer um pesquisa acerca de Allen Dulles e a Operation 40. Este programa procurou financiar e treinar activos com o propósito de travar a revolução cubana. Diz-se que esta brincadeira made in USA, entre outros aspectos, se materializou nas mais de 600 tentativas de assassinar Fidel e posto isto, será demasiado óbvio declarar que é obvio que traidores financiados pela CIA estejam presos em Cuba? Nos Estados Unidos, como já anteriormente aconteceu, a traição merece a pena capital. Mas claro, um atentado ao livre e justo Estado Americano é um pecado incomensuravelmente superior à tentativa de derrubar um Estado do Terceiro Mundo, ainda por cima comunista.
Nunca vivi em Cuba, nunca procurei emprego em Cuba, nunca fui a Cuba e nunca falei com nenhum Cubano. Julgo que por lá não há carros de luxo, nem roupa de luxo. Há prostitutas, como em Portugal e nos Estados Unidos. Julgo que por lá se é cuidado num dos mais eficientes e avançados Sistemas Nacionais de Saúde do Mundo. Que por lá se assistem a baixíssimas taxas de criminalidade. Que por lá a educação é um direito gratuito, não há analfabetos, que a mortalidade infantil é das mais baixas e a esperança média de vida das mais elevadas. Não há pastilhas elásticas e ninguém morre à fome por isso. Que há problemas económicos estruturais e como eles co-existe um embargo condenado internacionalmente, inclusivé pela ONU. Se forem lá e perguntarem a um Cubano se gosta da vida que leva, não descurem se a sua idade lhe permitiu viver em tempos pré-revolucionarios. E se arranjarem 50 cubanos fervorosos e prontos a lançar palavrões ao regime (de certo haverá mais), cuidem que em Portugal 2 milhões de portugueses vivem a baixo do limiar da pobreza, acredito que não dispostos a discursar docilmente em favor dos sucessivos governos nacionais.
Nunca vivi em Cuba, nunca procurei emprego em Cuba, nunca fui a Cuba e nunca falei com nenhum Cubano. Em nenhuma das linhas supracitadas disse que Cuba é o país perfeito, nem demonstrei vontade de para lá emigrar. Escrevo isto porque tenho vontade, sim, de aprender. Se tiverem também, talvez possamos falar.

8 comentários:

  1. Para um regime tão democrático e livre como apregoa o texto, o número de presos politicos em cuba parece-me exagerado: eram 112 mil em 1986. Só a titulo comparativo, no 25 de Abril o número de individuos encarcerados pela sua actividade politica era inferior a 1 centena.

    Os dados estatisticos sao coisas do DIABO. São eles e Fidel, como bem referiu o autor desta subrepticia manifestação comunista.

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  2. Tem razão, a existência desses presos políticos é condenável, o regime não é perfeito e provavelmente está longe disso. Sim, os dados estatísticos são perigosos: note que os que apresentou dizem respeito à guerra fria. Se analisar em maior detalhe as estatísticas dos presos políticos, verá também que hoje são pouco mais que uma centena, com tendência a diminuir. Desse modo, agradeço-lhe o reparo, no sentido em que o tema que aqui trouxe até valida a ideia de um progressivo avanço do regime cubano.

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  3. Ora era exactamente ai que queria chegar. Cuba tem vindo evidentemente a evoluir. E aquilo a que chama evolução trata-se efectivamente de uma progressiva ocidentalização do regime. Chega a ser até curioso que a defesa que tem vindo a efectuar ao Regime Cubano tenha por substracto uma evolução baseada noutros sistemas politicos e economicos que tanto abomina. A sua ideologia trata-se de uma falácia, não lhe parece?

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  4. Sendo anónimo não o conheço, daí não saber em que medida pode legitimamente, com tanto simplismo e segurança, afirmar aquilo que abomino ou apoio. Desculpe, mas não entendi o que quis dizer: tornei a ler o texto e não encontro nele explicitado a evolução baseada noutros sistemas, a que se refere. Vou partir do princípio que apenas se refere aos presos políticos e nesse caso, não há falácia nenhuma, a minha "ideologia" (como lhe chamou) assume como condenável a existência de presos políticos. Como nota de rodapé, divirta-se a pesquisar acerca da COINTELPRO, e fale-me depois em falácias da ocidentalização.

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  5. Dividindo a resposta em pontos fulcrais:

    O texto que escreveu é bastante transparente quanto às suas tendencias politicas e ideologicas. Mais uma vez se denota a incoerencia do seu argumento quando me diz que não posso afirmar que defende determinadas ideias e depois escreve, e passo a citar: "a minha "ideologia" (como lhe chamou) assume como condenável a existência de presos políticos". Caramba, então não é que eu tinha mesmo razão quanto ao racional que defende?

    O segundo ponto nem deveria ter de ser explicado. De facto, a opinião que emiti está longe de ser uma ideia presente no seu texto, como alias seria de esperar. Porque haveria eu de basear o meu argumento num texto com o qual não concordo?

    O terceiro e último ponto é bastante simples: ninguem defende que o Ocidente é perfeito, mas decerto é melhor que o regime Cubano.

    De relevar a tendencia demagógica de mudar de assunto quando convém. Tipico da esquerda nacional. Como é que a COINTELPRO se intrometeu na conversa? Já que estamos numa de disparar a tiro de caçadeira, deixo-lhe, para seu deleite, o seguinte link: http://en.wikipedia.org/wiki/Active_measures

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  6. Foi o prezado anónimo que, num acto de “eu sei mais de ti do que tu próprio”, inventou em mim a defesa de uma ideologia, que lá você sabe qual será. Penso à esquerda, é patente, mas basicamente o que fiz foi traduzir e transcrever a constituição cubana, citar mensagens papais, colar estatísticas e tentar ir contra o senso-comum ao tentar explorar a ideia de que em Cuba nem tudo é dantesco. Se para si isso é ser-se marxista-leninista, quem peca por falta de racionalidade é você.

    Em segundo lugar. Trata-se do mesmo anónimo que tem comentado anteriormente certo? O que referiu em comentários anteriores foi: “Chega a ser até curioso que a defesa que tem vindo a efectuar ao Regime Cubano tenha por substracto uma evolução baseada noutros sistemas politicos e economicos que tanto abomina.” ao que eu respondi: “Desculpe, mas não entendi o que quis dizer: tornei a ler o texto e não encontro nele explicitado a evolução baseada noutros sistemas, a que se refere.”... Não quer reformular o seu segundo ponto, com mais calma talvez?

    O seu terceiro ponto tornar-se-ia escusado se voltasse a ler as últimas linhas do texto que escrevi. No entanto, se até agora, para sí, o único ponto desfavorável em Cuba é o número de presos políticos em 1986, acho que gosta mais da ilha do que eu.

    O final do seu comentário é que me deixa pasmo. Ninguém aqui mudou de assunto. A COINTELPRO intormeteu-se na conversa, uma vez que referiu os progressos em cuba em termos de presos políticos como sendo uma ocidentalização do regime. O que quis trasmitir, foi a ideia de que, no seu ocidente, também ocorrem atentados à livre expressão política. Não julguei ter que explicar isso, desculpe.

    Para terminhar, obrigado pela partilha do link: vivi vinte anos com a ideia que as purgas soviéticas tinham sido uma invenção burguesa, o KGB um clube recreativo e os gulags campos de férias low cost. Deu-me uma nova prespectiva do mundo.

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  7. Caro Fernando, permita-me que teça alguns comentários acerca do seu artigo inicial.

    Diz assim na Constituição da República de Cuba:

    "artículo 5o.- El Partido Comunista de Cuba, martiano y marxista-leninista, vanguardia organizada de la nación cubana, es la fuerza dirigente superior de la sociedad y del Estado, que organiza y orienta los esfuerzos comunes hacia los altos fines de la construcción del socialismo y el avance hacia la sociedad comunista."

    Dito isto, o Fernando refere que a constituição foi referendada nacionalmente em 1976 (19 anos após a revolução). Não diz quais foram os termos, as circunstâncias em que isso aconteceu... porém dou isso de barato. Assuma-se que decorreu da forma mais democrática e transparente possível. Não acha que a existência de um partido único o qual rege o Estado é talvez antagónica a um Estado que se intitula de democrático?

    Pegando nas suas declarações "Estes candidatos são escolhidos de entre a a população (...)"
    Escolhidos, pergunto eu, por quem?
    Mas sejamos pragmáticos, o partido Nacional Socialista do qual Adolf Hitler (conhece?) fazia parte, foi o partido mais votado nas eleições e como tal, o querido Adolf foi indigitado Chanceler. Parafraseando-o "bastante ditatorial..."

    Quanto a disciplinas de voto, expulsões, etc... só me posso questionar se a sua memória é assim tão curta, ou as capacidades de investigação assim tão diminuidas.

    Quanto aos presos, ao sistema nacional de saúde, e ao resto, que como em todo o mundo há de tudo (lei dos grandes números, logo uma falácia), questiono quem faz as estatísticas? Portugal também é um país de estatísticas...

    Aproveite e dê um salto a Cuba e aprenda de facto in loco. Veja com os seus olhos... mas não fique pelas belas praias... tente viajar sozinho pelo país... maravilhe-se com a profusão de medicamentos nas farmácias, com o rosto de crianças felizes e luzidias que lhe oferecem sabão em plena rua porque têm de sobra...

    Claro, pero la revolución aún no está completa...
    Hasta la victoria siempre.

    Do seu Duque de Aveiro

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  8. A curiosidade levou-me a ler a constituição cubana, como julgo que também o fez. Daí que tenha lido esse artigo que referiu, daí que tenha apontado no texto que o PCC é partido único e daí que tenha chamado a atenção para a forma específica como se relaciona o partido e os processos eleitorais cubanos. Certamente também leu que todos os cubanos são automaticamente recenseados e têm direito de voto aos 16 anos. Leu também que existe uma Assembleia Popular :

    "Art. 73. Son atribuciones de la Asamblea Nacional del Poder Popular:
    a) acordar reformas de la Constitución conforme a lo establecido en el artículo 141;
    b) aprobar, modificar o derogar las leyes y someterlas previamente a la consulta popular cuando lo estime procedente en atención a la índole de la legislación de que se trate;
    c) decidir acerca de la constitucionalidad de las leyes, decretos-leyes, decretos y demás disposiciones generales;
    (…)"

    Vem agora o caso da Alemana Nazi que, com o devido respeito, acho uma comparação um tanto ao quanto estapafúrdia e infeliz da sua parte. Se é certo que Hitler foi eleito democraticamente, certo também será que após esta eleição não só os partidos políticos foram abolidos como todos os poderes passaram a ser concentrados na sua figura, após o famoso incêndio do parlamento.

    Um ministro seu, da propaganda, disse na altura:
    "The authority of the Führer has now been wholly established. Votes are no longer taken. The Führer decides. All this is going much faster than we had dared to hope."

    Não sou adepto do unipartidarismo, no entanto parece-me razoável assumir que, sendo os orgãos de governo cubano renovados periodicamente e eleitos de forma livre, não podemos de forma leviana chamar o estado cubano ditatorial.

    Não possuo prodigiosa memória, aceito isso, nem sou senhor de grandes capacidades de investigação... ainda assim não entendi o seu comentário.

    Assumo então que o caro Duque de Aveiro já foi a Cuba, certo?

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