quinta-feira, 7 de junho de 2012

V for Verity (I)

ver·i·ty, noun (pl. -ties)
a truth principle or belief, esp. one of fundamental importance.
-truth: irrefutable, objective verity.
In Oxford American Dictionary
Para inaugurar a minha participação neste blog, a mentira, nada melhor do que falar sobre Verdade. São três textos e três reflexões para as próximas três semanas. 
When problems overwhelm us and sadness smothers us, where do we find the will and the courage to continue? Well, the answer may come in the caring voice of a friend, a chance encounter with a book or from a personal faith.
For Janet, help came from her faith, but it also came from a squirrel.
Shortly after her divorce, Janet lost her father, then she lost her job. She had mounting money problems. But janet not only survived, she worked her way out of despondency and now she says life is good again.
How could this happen? She told me that late one autumn day when she was at her lowest, she watched a squirrel storing up nuts for the winter one at a time he would take them to the nest. And she thought ‘if that squirrel can take care of himself with the harsh winter coming on so can I. Once I broke my problems into small pieces I was able to carry them, just like those acorns, one at a time.’ [And the song kicks off…]
‘Little Acorns’, The White Stripes, Elephant, 2003

Que estória bonita! E ainda bem, é tempo disso. Acreditam nela? 
Pode alguém mudar de vida por causa de um esquilo? Ou porque leu o livro do António Feio, Aproveitem a Vida — não deixem nada por fazer nem por dizer? Não li o livro, mas adivinho-lhe simultaneamente uma lição de vida e uma mão cheia de banalidades. É muito difícil ensinar um caminho para a vida, e é muito difícil inspirar de um modo geral, para a vida ou para o resto (e o que é que resta?). A estória do esquilo é também uma banalidade, mas porque não, porque não mudar de vida a partir desse momento? Ao ouvir música Little Acorns?! Ou ao ler este texto?!! 

É claro que é bom partir os problemas em problemas mais pequenos, mais fáceis de resolver — be like a squirrel, be like a squirrel, canta Jack White. (Há quem concorde mais com Jack Daniels, 20 anos.) Mas isto, toda a gente sabe. Não aprendemos nada que não soubéssemos já. Existem sim momentos em que frases, conversas, livros e esquilos batem mais. How did you manage to change your life, Janet? — I got high on squirrel.
Janet não descobriu (um)a verdade: ‘ah, se eu partir os meus problemas, etc.’ Ela observou o esquilo, pôs-se a pensar no esquilo e na sua vida. Pôs as coisas em perspectiva. Não interessa, ganhou ânimo. Mas também nessa noite ela jantou, lavou os dentes, viu TV, olhou novamente pela janela, deitou-se (se dormiu melhor ou pior, não sei). Life goes on. E no dia seguinte fez cenas, lembrou-se do esquilo ao longo do dia, e fez mais cenas. Fez coisas que não teria feito se não fosse o esquilo. E a vida de Janet foi melhorando, falou com amigos e confidenciou a alguns a estória do esquilo; alguns acharam-na curiosa; quase todos a ajudaram. And now she says life is good again. Que bom! As coisas podiam ter corrido mal mas não correram. Ela podia ter desistido a meio mas não desistiu. E se calhar, pensou no esquilo algumas vezes. Por isso é verdade que o esquilo mudou a vida de Janet. Mas a verdadeira estória não pode ser contada, nem mesmo por Janet. Eu procurei descrever o que aconteceu — fez isto fez aquilo, lembrou-se da história, falou com amigos — porque descrever é o máximo que se pode fazer. A verdadeira estória teria de ser contada por dentro, do interior, e nem a Janet pode ‘viver para contá-la’. Sometimes it’s better 'making sense' than 'being true.' O esquilo fez sentido. Em todo o caso, foi um erro útil — ‘Falhaste em cheio, Janet!’


Trivia: as late as the 10th-century, a squirrel could’ve travelled, from Paris to Moscow, merely by jumping from tree to tree and never having to touch ground.
In Margaret Anderson, History 5: Spring 2008, Berkeley Podcast, 41m14s-26s, 1.The Boundaries of the West: Endings and Beginnings.

O que a levou a reflectir no esquilo? Como passou ela a noite, como acordou no dia seguinte? E o que se passou durante o sono? O que estava a pensar antes de falar com os seus amigos e familiares? Não conseguimos explicar, com verdade, a nossa motivação interior, nem para nós mesmos nem para os outros: porquê o esquilo e não a música ou este texto? Podia ter sido outra coisa. Da mesma forma, outras pessoas viram o esquilo e não lhes aconteceu nada; não bateu. Não conseguimos perceber a motivação interior dos outros. E essa seria a estória que interessa, e essa não pode ser contada. Tudo pode ser descrito e o essencial fica por dizer. Não podemos imitar Janet quando foi dormir, nem o que sonhou, nem como acordou. Não podemos repetir os seus passos nem a viagem do esquilo, de Paris a Moscovo. E eu não gosto de nozes. Só podemos esperar uma epifania análoga, que quando contada corresponda, com maior ou menor boa vontade, à estória da Janet. Não é mentira, não é verdade, mas é tão importante.

Sometimes it takes a squirrel…a twist in the kaleidoscope, to see things in different colors

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