Está quente e custa a
respirar... O verão começa-se a aproximar e o calor aperta. Como se não
bastasse, tens passado os últimos dias a escarafunchar o nariz no rolo de papel
da cozinha e tens gasto pequenas fortunas em lenços de papel. Fizeste “shotgun”
aos guardanapos lá de casa e eles dormem ao teu lado na cama. Mais ninguém pode
usar, são teus. Só não valem folhas A4 ainda porque arranham p’ra caraças e as
ideias têm que ficar eternizadas nesse papel. Estás outra vez com aquela tua sinusite
impossível, que te deixa o nariz assado de tanto te assuares, a vista a chorar
e te dá um mal estar do caraças, sem paciência para nada... Ah, e está um calor
impossível.
Acordaste cedo, ainda meio
lerdo, porque aqueles teus anti-histamínicos deixam-te totalmente grogue
durante os primeiros instantes do dia. Banho, fato, cereais, a rotina de
sempre. Fizeste o percurso habitual até ao escritório, mas hoje já não deu para
usares as duas alças da mochila do portátil ás costas... A recompensa de a
levar no braço foi uma camisa suada e não totalmente encharcada. O dia
passou-se e foi mais um daqueles dias no escritório. Nada de novo.
Sais cansado e agastado depois
de mais uma jornada de trabalho, depois de mais uma reunião onde descobres que
amanhã vai ser pior que hoje, mas pensas que é sexta-feira e não vai ser assim
tão mau (mas vai). Quando ainda vais a pensar no amanhã, deparas-te com o
dilúvio de hoje. A chuva cai interrompida e violentamente... Pensas: “Porra,
esqueci-me outra vez da porcaria do chapéu. A ver se isto passa...”. Passar
passa, porque passa sempre, mas isto é São Paulo e vai inundar rápido... Corres
até à estação de comboio, estrategicamente colocada junto ao escritório. Vais
no sentido do fluxo dos milhões da cidade e já não é só a chuva que sente que
sentes colada ao corpo... A humidade daquele trem equiparava-se a Manaus e a
densidade era típica de Sampa.
Sais na tua estação, decidido
em comprar mais um chapéu para te esqueceres também desse em casa da próxima
vez. Pões a mão ao bolso e tens 10 reais: “Opá boa, deve dar!”. Mas não... No
Brasil dão-se aulas de Pricing a cada
esquina: “Ah, está a chover. Ah, há mais procura! E o chapéu passou a 20 reais!”.
Estás sem dinheiro trocado e o caixa multibanco era só lá no cara... Tentas
negociar, mas não dá, hoje enquanto chover custa 20, quando parar volta a 10...
Vais ao próximo vendedor, mas o cartel estava montado, e pensas: “Foda-se, vou
a pé! É já ali...” Mas o já ali, são 2 km... É o preço de morar perto em Sampa.
Pões o pé fora da estação e o
caos estava a dar um concerto. O barulho das buzinas era ensurdecedor, o
trânsito estava para lá do caótico habitual, as ruas inundadas e a múvuca munida dos seus chapéus estava a
fazer-me pontaria ou então estavam demasiado ocupados em tentar chegar a casa
rápido... E a chuva caía agora ainda mais violentamente, mais quente, e tu no
meio disto tudo, doente, ensopado dos pés à cabeça e com a água a escorrer-te
pela ponta das mãos... Desistes! A chuva
a bater-te na cara até te parecia bem, pena estares doente... Os 2km foram
feitos com o pensamento no banho quente e na refeição tranquila com os amigos
lá de casa... Mas não, esta era a semana das quedas: primeiro uma ala do
estádio do Itaquerão (sede inaugural da Copa, pelo menos, acho que o plano se
mantém), depois o prédio de 5 andares em construção que ruiu (?!), e
finalmente, a árvore da rua ao lado de casa, que se desiquilibrou para cima de
2 carros e resolveu levar a eletricidade do Bairro toda atrás...
Chegas a casa a pingar, sobes a
pé porque o elevador não mexe, os sapatos ficam à porta, trocas de roupa e tens
que ir jantar fora, porque não consegues cozinhar porque não vês um palmo à
frente dos olhos... E aí pensas: “Foda-se, amanhã levo o chapéu, ou pago o
preço da chuva”.
epa, muita bom!
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