Quando a luz passa a vermelho,
eles lá vão. Dois homens não novos, barba por fazer, um deles
coxeia – nem interessa muito, mas duvido se o coxear trará mais
benefício por despertar dó ou prejuízo por tornar lentos os
movimentos. Vestem um colete vermelho, a legitimar a venda da revista
Cais. Até está calor, mas há vidros que se fecham com o seu
chegar.
Os vidros fechados pregam sustos porque
os dois homens podem esbracejar, bater com os nós dos dedos nas
janelas, falar, tudo é infrutífero. Um dos sem-abrigo chega a
julgar que em vez de carros está a abordar caixões onde o condutor
é um cadáver, talvez mesmo de cera, com a cara para a frente sem
pestanejar. Pode isto nem ser metáfora, provavelmente existe uma parte da
pessoa que morre momentaneamente para que nasça essa indolência
própria de semáforo vermelho.
Depois, o acordar. A paralisia do
condutor dá lugar a uns pequenos movimentos. A mão mexe para
corrigir a manete das mudanças. Se está vivo, talvez possa estender
a mão com umas moedas. Não. Quando o semáforo fica verde-esperança, a esperança dos dois homens não novos desaparece. Hora de
voltar ao passeio.
Sem comentários:
Enviar um comentário